Instrumentos não previstos na lei viabilizam recuperação de empresas em dificuldades

recuperação judicial

Recentes instrumentos não previstos na lei – mas aplicados pela Justiça – viabilizam a sustentabilidade de empresas em recuperação judicial. Em São Paulo, a 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo tomou uma medida inédita ao permitir que uma holding apresentasse um único plano das 50 empresas do grupo. Em outra frente, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) autorizou que empresas nesse processo possam participar de licitações. A exigência é que comprovem a sua recuperação econômica com um plano consistente.

Os novos critérios adotados pela Justiça são fundamentais para garantir a sobrevivência de empresas em dificuldades, no entender da sócia da Advocacia Luiz Tzirulnik, Andréa Modolin. Diante da inexistência de leis que autorizem essas ações, a especialista no assunto explica a importância desses esforços. “Verificamos que a Justiça, ao prevalecer sobre a lei, mostra preocupação com a função social. Se uma empresa quebra, há toda uma cadeia produtiva envolvida no processo que, além de não gerar riquezas, agrava o desemprego.”

Uma das alternativas conhecida como consolidação substancial – envolve a apresentação de um plano único para um grupo empresarial – tem uma série de pontos positivos no entender da advogada. Para garantir a legalidade do plano, ela menciona o critério tetrafásico já aplicado com sucesso pela Justiça. Como o próprio nome diz, relaciona-se à avaliação de quatro itens. O primeiro faz o controle das cláusulas do plano, independentemente de ter sido validado pela maioria dos credores. Em linhas gerais, verifica-se para quem a empresa deve e como os valores serão acertados.

Na segunda etapa, a especialista alerta que é fundamental observar a existência de vícios do negócio. “Um exemplo, a empresa pode oferecer como pagamento a sua marca, mas ela pode não existir. A ideia é evitar vícios de pagamento. O objetivo é coibir as condutas fraudulentas.

O terceiro item depende da verificação da extensão da decisão aos demais credores envolvidos no processo. E, por último, entra a análise da possível abusividade do voto do credor. “Uma preocupação é evitar o que normalmente acontece. O credor com maior poder abusa de sua autoridade e, ao aprovar o plano, busca se beneficiar, por exemplo, garantindo o seu pagamento antes dos demais”, explica a advogada. O voto do credor também deverá respeitar a função social do processo.

A mudança da lei de recuperação judicial deve entrar na pauta de discussões no próximo ano. “É preciso acabar com o medo da recuperação judicial. Para isso, é importante formar uma força única para combater o calote, envolvendo os maiores credores, os banco e o fisco”, defende a especialista no assunto. A atual legislação dificulta os pedidos de recuperação judicial. “O risco Brasil está muito grande e muitas empresas estrangeiras estão indo embora.”

O atual cenário econômico também dificulta que as empresas vençam as dificuldades financeiras. “No caso de grupos, uma unidade pode ajudar outra e, com isso, garante-se  a sustentabilidade uma cadeia produtiva, incluindo fornecedores, varejistas e todos envolvidos direta ou indiretamente com o negócio”, defende Andréa Modolin.

O plano único é um instrumento interessante porque, além de oferecer mais garantias de que o grupo poderá se recuperar, evitará as fraudes que frequentemente acontecem no cenário empresarial. “Um grupo em dificuldades deixava uma falir e abria outras empresas para se livrar das dívidas.”

Outras condições para a apresentação do plano único são importantes, como a composição da diretoria e societária ser idêntica, a relação de controle e dependência, a alocação de ativos, garantias cruzadas etc. A chance do processo ser bem-sucedido é maior, pois se uma empresa não puder pagar, as demais deverão assumir o débito, no entender da advogada.

O fato da companhia enquadrada na Lei 11.101/2005 poder participar de licitações é mais um mecanismo que auxilia na sustentabilidade dos negócios em dificuldades. “Se a empresa já apresentou um plano e os critérios foram aplicados, não há razão para não participar”, afirma.

Quanto aos riscos de não honrar com os compromissos, a advogada acredita que outras medidas – como a exigência de auditoria independente habilitada – pode aumentar a segurança e facilitar que as companhias endividadas participem da licitação. “É importante mudar os critérios da lei para abrir essa possibilidade.”

Fonte: Jornal Contábil