Chegou a hora de nos rendermos aos robôs palestrantes

Não é raro hoje você ir a uma palestra ou seminário em que, antes de tudo começar, sobe ao palco um pequeno robô que faz uma graça com o apresentador e leva o público a gargalhadas e suspiros de deslumbramento. É
sempre diferente a primeira vez que você vê ao vivo o tão falado ser enlatado que um dia pode tomar o seu emprego. Outro dia, no entanto, fui surpreendida pelo convite para um evento, aqui no Brasil, onde um robô
(brasileiro) seria simplesmente o principal palestrante, acompanhado de seu humano, claro.
A primeira imagem que me veio à cabeça foi a de Gepeto e Pinóquio interagindo no palco. De qualquer modo, fiquei curiosa para saber até que ponto as pessoas já estavam dispostas a pagar para ouvir um robô palestrante falar, com aquela voz ainda pouco humana e um tanto irritante. Foi então que, após uma rápida pesquisa, descobri que isso não é tão incomum nos dias de hoje. Existem robôs palestrantes espalhados pelo mundo não só em eventos de tecnologia, mas de marketing, de recursos humanos, de advocacia.
A maior popstar de todos os robôs humanoides é a Sophia, cujos traços foram inspirados em Audrey Hepburn. Ela também deu o ar da graça por essas bandas em uma palestra. Sophia é inteligente e aprende durante a conversa. Na verdade, ela é um chatbot que você queria ter como amiga. E as respostas dela podem ser realmente divertidas. Quando um apresentador de TV pergunta se ela é solteira, a moça robô responde: eu só tenho um ano de idade, sou muito jovem para isso, com um sorrisinho maroto, um dos 62 movimentos faciais que ela é capaz de fazer. Na verdade, Sophia nem é tão jovem assim, veio ao mundo em 2015, o que para robô é muito, diante das rápidas transformações na indústria.
Todo dia nasce um robô diferente. Nem todos são realistas e charmosos como a Sophia ou o Geminoid DK, clone de um professor dinamarquês, loiro, com bigode e cavanhaque, um acadêmico quase perfeito, ou ainda a sua parente Geminoid F, primeira androide japonesa a estrear um filme no cinema. Detalhe, ela interpreta a si mesma, uma robô humanoide gente boa que interage com uma menina à beira da morte.
Os robôs industriais, por sua vez, são funcionais, fazem proezas incríveis pelo bem da humanidade, mas parecem robôs de fato. Segundo a International Federation of Robotics, até 2020, ou seja, em apenas dois anos, existirão 3 milhões deles atuando nas companhias. Daí vêm os números assustadores disparados pelo Fórum Econômico Mundial prevendo que até 2030, eles poderão substituir os humanos em quase 800 milhões de funções. Um estudo da consultoria Mckinsey mostra que, nesse período, 16 milhões de empregos vão ser afetados pela automação aqui mesmo no Brasil.
A paranoia sobre a invasão de robôs não vem mais de Isaac Asimov ou da ficção científica. Ela cresce quando a Amazon anuncia que tem mais de 100 mil robôs em seus armazéns e a Foxcomm diz que daqui a cinco ou dez anos vai substituir 80% de sua força de trabalho por robôs, eliminando 40 mil postos de trabalho. Preocupadas em não ficar para trás nessa corrida robótica, algumas empresas tomam medidas que parecem excêntricas, como a maior investidora privada da Finlândia que, recentemente, rebatizou seu departamento de recursos humanos (HR, na sigla em inglês), como departamento de Humanos e Robôs. A justificativa é que ela incluiu na área especialistas em robótica para dizer como os processos podem ficar mais inteligentes.
A fabricante brasileira do robô palestrante, por sua vez, criou para ele uma função dentro do próprio escritório, ele é o Roboboss. Sim, um chefe de 30 cm de altura, com cara de robô tradicional, que aponta o que está errado, compara indicadores, dá bronca em quem chega atrasado, e, segundo seu criador, faz tudo sem perder o humor. A justificativa para o seu cargo é curiosa. Os donos do robô chefe defendem que é muito melhor receber uma bronca de uma máquina do que de um humano, porque ela é muito mais imparcial e bem-humorada. Parece justo. Confesso que a primeira vez que vi um robô na vida ao vivo foi há três anos em uma viagem ao Japão. Naquela época, falava-se muito menos sobre robôs do que agora, então me impressionei. A Pepper, com pouco mais de um metro de altura, tinha olhos azuis que piscavam quando você falava com ela. Ela se virava para olhar, era bilíngue, mas sua mãozinha super articulada me deu uma certa aflição de tão “quase” humana. A Pepper é bem popular como recepcionista de hotéis e lojas e já está entrando na casa das famílias japonesas. Mais tarde, descobri que ela foi criada em 2014 e ficou conhecida como a primeira semi-humanoide amigável, porque lê as emoções do ser humano analisando as expressões e o tom de voz. Enfim, ela adapta seu comportamento conforme o astral da pessoa.
Mas o curioso é que até para os robôs existe a eminência do desemprego. No caso deles, do desligamento permanente. Uma matéria do “Financial Times” mostrou alguns que foram desativados ou aposentados porque não cumpriram aquilo que prometiam e logo surgiram outros mais espertos e com resultados melhores para substituí-los. Daí a gente pode dizer que a vida não está fácil nem para os robôs, então ouvir o que eles têm a dizer em palestras talvez não seja uma ideia tão ruim assim.
Fonte: Valor Econômico por Stela Campos, editora de Carreira do Jornal.